Testemunho

06.03.2025
Andreia, 29 anos | Testemunho Pessoal
Crescemos a assistir a uma onda de felicidade sempre que alguém mostra um teste de gravidez positivo.
São exclamações, muitos sorrisos e um brilho no olhar, são “muitos parabéns”, etc.
Quando vi o meu “positivo” também sorri e consegui, até, fazer uma graça ou outra, mas ao mesmo tempo, era invadida pelo pânico.
Sabia que estava tudo errado ao mesmo tempo que via concretizado um sonho.
Enquanto tentava tomar uma decisão, dei início ao processo de Interrupção Voluntária da Gravidez (IVG).
Ouvi, várias vezes, as palavras - "objetor de consciência"- e só pensava se havia algo de errado com a minha consciência.
Vivia em Cascais e o meu processo passou para Lisboa. É assustador pensarmos que estamos numa capital, que deveria ser um centro de desenvolvimento e no entanto, na realidade, é apenas uma pequena amostra do que achamos serem os cuidados de saúde da Mulher.
Todo o tempo que passei na clínica, parecia que estava a viver uma “cena ilegal” de um filme.
Acredito que, nem toda a informação que preenchemos nos formulários, foi devidamente lida e além disso, quando saí da consulta, deparei-me com um homem, de uma qualquer ordem religiosa, a oferecer apoio a "mulheres perdidas".
O apoio psicológico oferecido durante o processo é feito na própria clínica e muito enviesado. As consultas privadas são caras. Nas caixinhas de perguntas das páginas de Instagram, nenhum psicólogo conhecia grupos de apoio. Nos fóruns da internet falados em português, muitos em português do Brasil, o tema: IVG era e é ilegal. Ainda assim, nesses fóruns, a maior parte refere-se a abortos espontâneos ou a perdas gestacionais e isso, no meu entender, só aumenta o fosso.
Os poucos sites que referem a IVG, mencionam que a mulher se costuma sentir aliviada depois de a fazer, por ser aquilo que quer - não foi o meu caso.
Não que alguém me tenha obrigado, mas o medo, o racional e a lógica, sim e acredito que seja o caso de muitas outras mulheres, também.
Felizmente, tive muito apoio daqueles que me eram mais próximos.
Felizmente, vivemos num país onde, legalmente, se podem tomar decisões que são muito pessoais, mesmo que ainda não se falem sobre elas.
Ainda não sou mãe, mas acredito que ser uma boa mãe signifique, muitas vezes, tomar decisões difíceis.
Naquele momento, fui uma melhor mãe por ter decidido não o ser.