Testemunhos Pessoais

Testemunhos Pessoais

Eu sempre soube que o meu irmão era o preferido...

Dois testemunhos, duas perspetivas diferentes sobre um mesmo assunto. Será que são as únicas pessoas que sentem que os pais têm um filho preferido? Ou será que é uma realidade para muitas pessoas que têm medo de o admitir publicamente?

A Maria (nome fictício) tem 20 anos de diferença do irmão e tem plena consciência que não é a preferida dos pais. A Maria tem, agora, 37 anos e o irmão 57.

Desde que se lembra, o irmão sempre foi o preferido pela forma como os pais o tratavam e pela preocupação excessiva que existia com ele.  

Já confrontou os pais e o irmão, várias vezes, sobre o assunto: “sim, sempre brinquei, tanto com os meus pais como com o meu irmão. Nunca me foi dito que era verdade, mas através de sorrisos e beijinhos, também nunca ninguém me negou”.

Ainda que, para a Maria, este comportamento da família seja evidente, garante que não a afeta: “digo sempre que é só por ser rapaz e eu ser menina”.

Quando a questionámos sobre em que momentos se sentia “menos especial” que o irmão, a Maria deu-nos exemplos muito simples e que aconteciam e, ainda acontecem, com bastante frequência na casa dos pais.

“O ter de esperar por ele para comer, pois chega sempre atrasado. Ou até, na escolha da comida, do prato e dos talheres que ele gosta.”

Quisemos saber se, de alguma forma, esta diferença que sentia dentro de casa a moldou enquanto pessoa e a Maria afirmou: “não sei bem de que maneira me possa ter moldado, como sempre levei “na boa”, nunca dei importância a não ser, quando estamos em família, que é sempre mais um motivo de brincadeira, confusão e de discórdia entre todos”.

Aproveitámos o momento para dar liberdade à Maria de dizer o que nunca disse aos pais. Uma mensagem que gostasse de passar a todas as famílias em que esta seja uma realidade:“os pais deviam admitir que é normal gostar mais de uns do que de outros, o ter consciência pode ajudar a melhorar a relação entre todos”.

Tivemos, também, a oportunidade de conversar com a Iara (nome fictício) que tem sete anos de diferença do seu irmão. A Iara tem 21 anos e o irmão 14.

Começou por nos contar que quando o irmão nasceu pensou que se tratassem, apenas, de ciúmes, no entanto, com o passar dos anos percebeu: “os meus pais tinham e têm uma preferência pelo meu irmão”.

Admitiu que já falou, algumas vezes, com o irmão que desvaloriza o assunto: “diz-me que vejo coisas onde não existem. Já os meus pais, negam a pés juntos que exista um favorito”.

Quando questionámos se esta é uma situação que a tem afetado, a Iara respondeu, prontamente, que sim: “sempre afetou, no entanto, desde que saí de casa para viver sozinha e que os meus pais passam muito mais tempo com ele, tem sido diferente. Sinto que demonstram uma maior preocupação em relação a mim”.

Pedimos que nos esclarecesse em que momentos específicos sente uma verdadeira diferença entre ela e o irmão e a resposta que nos deu foi: “o meu irmão sempre foi o filho perfeito, com notas excelentes e bem-sucedido no desporto. Eu não. Sempre fui uma aluna mediana e fazia desporto porque tinha de ser. Os meus pais falam bastante nele a toda a gente como sendo o menino dos olhos deles”.

Outro exemplo que nos deu, foi a forma como os pais se dirigiam a ela sempre que estavam incontactáveis durante algum tempo: “se ficarmos horas sem atender o telefone, a primeira pergunta que fazem é: e ele como é que está? Ele está bem?”.

Iara foi aprendendo a viver e a gerir esta diferença que sempre sentiu dentro de casa: “como a relação com o meu irmão sempre foi muito próxima e boa, eram mais os momentos em que me esquecia deste sentimento do que os que valorizava, mas não escondo que, em alguns momentos enervava-me e chegava a pôr-me em causa: será que não faço nada bem?”.

Mesmo perante esta adversidade, Iara garante que conseguiu tornar-se uma pessoa confiante.

“Os pais que têm mais ligação com um filho do que com o outro, tentem não o demonstrar porque podem afetar mesmo a vida e o crescimento dos vossos filhos” – esta é a mensagem que a Iara gostava que chegasse aos pais que têm consciência de que não amam os filhos de igual forma.